Veículo: Jornal: Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) - Seção: Direito e Justiça - 19/05/2004
Brasil defendeu durante a assembléia anual da OMS a necessidade de os países em desenvolvimento terem condições de garantir o acesso de todos aos remédios.
O Brasil defendeu ontem, no segundo dia da assembléia anual da Organização Mundial da Saúde (OMS), a necessidade de os países em desenvolvimento terem condições de garantir o acesso de todos aos remédios. O ministro da Saúde, Humberto Costa, qualificou de "moralmente injustificável e economicamente errado" excluir a maior parte da população mundial de algo que deveria ser universal.
Em discurso no plenário da assembléia, realizada em Genebra, o ministro Humberto Costa alertou sobre a aparição de doenças crônicas degenerativas entre grupos de pessoas de baixo poder aquisitivo nos países em desenvolvimento. "É um fenômeno novo que não pode ser ignorado nas políticas de saúde pública", disse. "A chegada ao Sul de doenças até agora típicas do Hemisfério Norte constitui uma amarga ironia", completou.
O ministro acrescentou que é importante refletir sobre o impacto do regime de propriedade intelectual sobre a saúde pública. "A Comissão sobre Propriedade Intelectual, Inovação e Saúde Pública da OMS tem a enorme responsabilidade de examinar a questão do impacto sobre a saúde pública do regime de patentes de remédios", disse Costa.
Criada há um ano, a comissão tem como objetivo analisar os direitos de propriedade intelectual e os mecanismos apropriados de financiamento e incentivo para desenvolvimento de remédios contra doenças que afetam o mundo em desenvolvimento.
"É muito importante que seus resultados não sejam ofuscados por questões econômicas e comerciais, que, por mais importantes que sejam, devem se submeter às necessidades de saúde pública e à universalização do acesso aos remédios", disse Humberto Costa.
"De pouco serve promover políticas públicas de saúde, se, por causa de preços com forte impacto nos orçamentos nacionais, não for possível ter acesso aos remédios necessários para os tratamentos", observou o ministro da Saúde.
Costa mencionou ainda o apoio brasileiro à meta do diretor-geral da OMS, Jong Wook Lee, de estender o tratamento anti-Aids a 3 milhões de doentes até 2005. "Todos temos a esperança de que essa iniciativa não se frustre por uma visão estreita e egoísta de interesses alheios à saúde pública", afirmou o ministro, reiterando a disposição do Brasil de facilitar o tratamento de 200 mil soropositivos com anti-retrovirais genéricos como parte de seu programa de cooperação internacional.
"Utilizar os remédios genéricos é essencial para o tratamento contínuo e sustentável de pacientes com patologias crônicas", concluiu o brasileiro. Paralelamente, Lee enalteceu o fato de Moçambique ter se tornado em março no primeiro país africano a emitir uma licença obrigatória para a fabricação de medicamentos anti-retrovirais para satisfazer as necessidades nacionais.
Uma licença obrigatória, que depende de condições estabelecidas pela Organização Mundial do Comércio (OMC), é a permissão dada por um governo a um fabricante nacional para produzir um remédio ou utilizar um procedimento patenteado sem o consentimento do titular da patente, com objetivo de atender emergências médicas por meio do acesso a remédios baratos.