Veículo: Jornal: O Globo - Seção: Economia - 25/05/2004
Tecnologia de venda de música na internet finalmente vai tomando o caminho da lei.
Quantas músicas cabem em um CD? Cerca de 30, se o gênero musical em questão for o hardcore, ou umas cinco de rock progressivo: o disquinho prateado tem um pouco menos de 80 minutos de capacidade, e uma canção, em média, dura de três a quatro minutos. Tudo isso é nada se comparado à quantidade de músicas que se pode armazenar em um hard disk de computador, praticamente ilimitada. E mais: os arquivos digitais de música já podem acompanhar o ouvinte aonde ele for, num aparelhinho chamado Ipod, que pesa quase o mesmo que um celular. Ah, mas baixar música pela internet é contravenção. Nem sempre: o site www.imusica.com.br vende 25 mil músicas por mês, por R$ 1,50 cada, em média, tudo autorizado. Seu correspondente americano, o itunes, tem um movimento brutal: são 2,3 milhões de faixas baixadas por semana. Os profissionais do ramo acham que o download ilegal está sendo substituído pela lei.
- Em um site como o Kazaa (um dos preferidos pelos usuários da troca de arquivos musicais na rede desde o fim do Napster), você não tem nenhuma garantia: muitas vezes a versão baixada não é a que o usuário quer, a qualidade não é boa ou a faixa está incompleta - enumera Felipe Llerena, diretor do Imusica. - O Brasil já tem 1,3 milhão de usuários de banda larga. Com a internet rápida, em três minutos se baixa uma música, em média. É muito fácil.
Então é o fim dos CDs e das gravadoras? Não necessariamente.
- As companhias, pelo menos como editoras, ganham dinheiro com a venda das faixas - lembra Llerena.
Além disso, uma pesquisa recente nos Estados Unidos concluiu que o download ilegal de música não afeta as vendas de discos. Segundo o relatório dos professores Felix Oberholzer-Gee, da Universidade de Harvard, e Koleman S. Strumpf, da Universidade da Carolina do Norte, é preciso baixar cinco mil CDs inteiros para que uma cópia a menos seja vendida. Segundo eles, as vendas de discos nos EUA caíram nos últimos anos devido a fatores como crise econômica, um número menor de lançamentos e o fim da substituição dos catálogos que só existiam em LP por CDs.
E não faltam novidades: uma das meninas-dos-olhos econômicas da indústria atual é a música nos celulares.
- São quatro milhões de downloads de músicas por mês - contabiliza Llerena. - E logo estarão chegando modelos novos de aparelhos que tocarão a música como ela está no CD, não mais em arquivos midi, que são essas versões atuais.
A parada do Imusica parece saída de um ou dois anos atrás: estão lá, entre as músicas mais vendidas, "Tô nem aí", de Luka, "Epitáfio", dos Titãs, e "Primeiros erros", do Capital Inicial, e algumas ainda mais inusitadas, como o "Tema da vitória" (o pam-pam-pam de Ayrton Senna), de Eduardo Souto Neto, e "Aquarela", de Toquinho e Vinicius. Alcione fecha a lista com a versão ao vivo de "Você me vira a cabeça".
- Pensaram que sambista não navega? - brinca a Marrom. - Lá estamos nós, na internet. Estou em um momento muito especial, feliz.
O Ipod ainda é o mais popular dos aparelhos de MP3, mas a concorrência está tentando alcançar a Apple: marcas como a Gradiente, a Samsung e a Sony já estão colocando os seus no mercado. Por enquanto, um aparelho como esses custa em torno de R$ 1 mil.
A gravadora Trama, sempre tecnológica, está fazendo sua parte no novo movimento: ela colocou no ar o site www.tramavirtual.com.br, para músicos independentes. Quem quiser tem direito a uma página própria e pode colocar suas músicas à disposição de graça.
- O site estava no ar desde dezembro de 2002, de forma experimental - diz o produtor musical Carlos Eduardo Miranda, diretor da Trama Virtual. - As idéias foram chegando e ele evoluiu até o estado atual.
O figuraça gaúcho - criador de selos como o Banguela, primeira casa dos Raimundos - garante, no entanto, que novas idéias continuam sendo bem-vindas ao site.
- Estou sempre no fórum de debates, conversando com o pessoal - diz ele. - Já nos propuseram começar a vender músicas de artistas mais estabelecidos, de pequenos selos como o Midsummer Madness e o Monstro. A idéia é boa, vamos ver.
Como a maioria dos investimentos da Trama, o site é caro (embora Miranda não saiba precisar um valor): são oito pessoas trabalhando há três anos, afora os equipamentos e o espaço na internet. Em matéria de promoção, no entanto, está valendo a pena: uma semana após a inauguração oficial, já havia quase seis mil músicas disponíveis, de cerca de 1.300 artistas.
- Temos muitas idéias que podemos realizar, como uma coletânea ou um disco de remixes - diz Miranda. - O que fazemos é em prol da cultura brasileira, mostrando para todos a música de diversas regiões do país.
Canções de artistas como Zefirina Bomba, Osmarmotta, Geraldo Darbilly e Maricéa - todos já na Trama Virtual - fazem a festa de uma nova geração: a dos fãs que não freqüentam lojas de discos.